quinta-feira, 3 de novembro de 2011
O começo é a parte mais importante do trabalho – Os últimos anos do filósofo Platão
Por volta de 387 a.C., já em Atenas, Platão se instalou num sítio nos arredores da cidade-estado. No local, ele fundou sua própria escola de investigação científica filosófica. Denominada Academia, a instituição que adquiriu prestígio de imediato, se destacava por uma inscrição em sua fachada: “ Que aqui não entre quem não for geômetra”. Com esse chamativo, inúmeros jovens que buscavam instrução passaram a frequentá-la.
Em pouco tempo, a escola que poderia ser descrita com uma espécie de irmandade, se tornou um dos maiores centros culturais da Grécia, tanto que políticos e filósofos como Aristóteles ( que ingressou nela aos 17 anos), Demóstenes, Eudoxo de Cnido e Esquines, passaram a procurá-la para debater suas idéias sobre todos os temas do saber até então conhecidos: matemática, geometria, história, música, astronomia, além da própria filosofia.
Consagrada ao herói Academos, a Academia primava pelo ensinamento dialético ( na Grécia Antiga, a arte do diálogo ou da contraposição de ideias que leva a outras), no qual, o saber era encontrado mediante um processo endógeno ( pela busca individual), por meio de constantes questionamentos. Por ser fundamentada no princípio da produção, a escola de Platão se rivalizava com a escola de Isócrates (orador e retórico ateniense, que viveu por volta de 436 a.C. e morreu, provavelmente, em 338 a.C.), na qual, o conhecimento consistia meramente na assimilação do saber que já foi produzido (como ocorre na maioria das escolas, na atualidade). Dentro do contexto histórico, a escola de Isócrates desenvolvia uma educação bem mais realista que condizia, em todos os aspectos, com a democracia ateniense.
Já na Academia, tais pesquisas eram originais e concebidas pelo esforço do grupo que tinha no conhecimento algo vivo e dinâmico, e não um corpo de doutrinas a serem resgatas e transmitidas. Caracterizada ela inquietação, a escola buscava a reformulação permanente, multiplicando as vias de abordagem dos problemas, inclusive os políticos, que deixavam de se limitar à prática circunstancial. Dessa forma, a investigação da conduta humana também extrapolava o plano psicológico e ético, para abranger uma explicação global da realidade, na qual, a conduta se desenrolava. Em última instância, como a educação deveria basear-se numa episteme (ciência), para ultrapassar o plano instável da opinião, a política também deixaria de ser motivada por interesses escusos, para se transformar numa ação justa e harmoniosa, guiada pela verdade.
A matemática também era ensinada como um caminho para superar os questionamentos de Sócrates, que haviam ficado sem respostas. Como Platão acredita que ela poderia conduz a certeza, deu continuidade aos trabalhos desenvolvidos pelos pitagóricos, com os quais mantinha relações, como Arquitas de Tarento e Teodoro de Cirene. Nesse período e por quase vinte anos, o fundador da academia se dedicou a o magistério e a composição de suas obras. Influenciado pelo pitagorismo, ele escreveu os diálogos de transição, que marcam seu desligamento dos conceitos socráticos e o surgimento da formulação de uma filosofia própria, que se originou a partir de uma nova solução para o problema do conhecimento, que assumia a doutrina das ideias que invocam formas incorpóreas e transcendentes que determinavam o modelo dos objetos sensíveis.
Em 367 a.C., com a morte de Dionísio I e para atender ao pedido de Dion, Platão interrompeu sua produção filosófica e o exercício do magistério para retornar a Siracusa. Segundo alguns historiadores, os dois amigos acreditavam que, aquele momento era o ideal para reformar a vida política da cidade, que passaria a ser governada por Dionísio II. Considerando que Siracusa era a mais luxuosa cidade do mundo grego, provavelmente a intenção de Platão era bem mais prática e objetiva, do que implementar os ideais políticos explicitados na obra A Republica. Com sua visão de estadista, ele queria preparar o jovem tirano para refrear os avanços dos cartagineses e se, possível, expulsa-los em definitivo para a Sicília, onde há algum tempo, já estavam instalados. Dessa maneira Siracusa se tornaria o centro da forte monarquia constitucional que congregaria o conjunto das comunidades gregas do oeste da Sicília, que unidas poderiam opor resistência aos invasores estrangeiros. Dionísio II não aceitou os conselhos de Platão e a missão fracassou. No entanto ao estabelecer laços de amizade com Arquitas de Tarento, o novo tirano deu um passo importante rumo à unificação política de parte do mundo helênico.
Graças à preocupação política e como Dionísio II declarou que ia seguir sua orientação filosófica, Platão retornou a Siracusa em 361 a.C. Pressionado por Dion que havia sido expulso da cidade, mas mantinha seu ideal de instaurar um regime de classe que aliasse a autonomia e a liberdade, como também queria Platão, a segunda incursão também foi decepcionante. Dionísio II não modificou sua conduta política, não trouxe Dion de volta a cidade e nem se entregou ao estudo da filosófica, como havia prometido. Se não bastasse, ainda reteve Platão na cidade. O filosofo só conseguiu sair de Siracusa devido à interferência de alguns amigos de Tarento. Em seu regresso, encontra-se com Dion que prepara uma expedição contra Dionísio II.
No inicio, a expedição foi um sucesso, Dion consegue livrar Siracusa da tirania. Mas em pouco tempo, encontrou oposição às reformas propostas, tanto que, durante a agitação política que tomava a cidade, foi traído e assassinado por um de seus amigos. Platão que havia perdido seu grande amigo, ainda sofreu mais um golpe, ao descobrir que mandante do crime tinha sido Calipos, um ateniense ligado a Academia e que tinha partido com Dion para Siracusa. Diante de tais fatos, encerrou sua participação política em Siracusa e decide voltar para Atenas, onde passou a dedicar-se a Academia. Reassumiu sua direção e permaneceu no cargo até 347 a.C., ano de sua morte.
Em paralelo continuava a elaborar de obra escrita, levantando novos problemas ou reexaminando os antigos sobre outro prisma. De acordo com os historiadores, na sequência do Sofista e do Político, Platão deveria escrever o Filósofo, diálogo que teria novamente Sócrates como personagem principal. Mas a obra que não chegou a ser escrita foi substituída por Timeu e Crítias, que por sua vez, deveriam fazer parte de uma trilogia que ficou inacabada e que teria o final em Hermocrates. Em Timeu que tem como tema o mito cosmogônico, a origem do universo é descrita por Platão por meio de influências pitagóricas. Já em Críticas, o filósofo grego invoca um Estado semelhante ao descrito em A Republica, identificando-o a Atenas pré-históricas, que teria salvado o mundo mediterrâneo dos invasores de Atlas. Na fase final de sua, Platão ainda retoma a felicidade humana, com base em suas últimas formulações. Ao morrer, o filósofo grego deixou inacabada a obra as Leis, na qual, o problema político é novamente trazido à tona, por intermédio das teses já divulgadas em A República, e por uma proposta de conciliação entre a monarquia constitucional e a democracia.
Como a vida de Platão transcorreu entre a fase áurea da democracia ateniense e o final do período helenístico, suas obras representam em vários aspectos, a expansão de um pensamento alimentado pelo clima de liberdade e de apogeu político. Dentro desse contexto, ele construiu a primeira grande síntese filosófica do pensamento que ainda hoje é explorada. Em Platão, o mito e a poesia confundem-se, muitas vezes, com os elementos puramente racionais do sistema, mas é fácil perceber que em todos os seus escritos, graças ao diálogo, ocorre à transição espontânea entre o ensinamento oral e fragmentário de Sócrates e o método estritamente didático de Aristóteles.
Curiosamente, a Academia que admitia mulheres desde que elas se vestissem como homens, continuou existindo por séculos, após a morte de Platão. Ela só foi fechada em 529, por imposição do Imperador Romano do Oriente desde primeiro de agosto de 527 até à sua morte que ocorreu em 14 novembro de 565), que ao redigir um sistema de leis básico, reafirmava seu poder ilimitado como imperador para controlar todo o sistema político e religioso. Esse poder não chegou a ser totalitário. O império era vasto e composto por povos de naturalidade e línguas diferentes, que conseguiam escapar do controle das autoridades imperiais e manter certas tradições culturais particulares. Infelizmente a Academia não resistiu.
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